A realidade da fantasia Olavo de Carvalho

A realidade da fantasia Olavo de Carvalho O Globo, 15 de setembro de 2001 Quando um mesmo fenômeno é descrito de duas maneiras opostas por quem está no centro dos acontecimentos e por quem sofre seus efeitos a léguas de distância, muito provavelmente a primeira versão é realidade e a segunda fantasia. Mas dizer isso não basta. Se não sabemos como a fantasia veio a nascer de dentro da própria realidade, não compreendemos a realidade. O exemplo mais claro é a Nova Ordem Mundial. Vista do Brasil, que é um país periférico, ela é apenas um novo nome do capitalismo norte-americano. Vista dos EUA, que estão no centro do quadro, ela é um projeto socialista e essencialmente anti-americano. Evidentemente os americanos estão vendo a coisa certa e nós, para variar, estamos delirando. Alguns dados escandalosos, geralmente escamoteados à opinião pública brasileira, mostrarão isso da maneira mais evidente: 1) Na última década, os EUA desmantelaram seu sistema de defesas nucleares, reduzindo seu estoque de armas atômicas para um quinto das reservas russo-chinesas, cedendo a Pequim o controle de áreas estratégicas como o Canal do Panamá e deixando a espionagem chinesa livre para operar em território americano. 2) Ao mesmo tempo, os EUA, violando abertamente a própria Constituição, cediam à ONU parcelas cada vez maiores de sua soberania nacional, aceitando a ingerência dos organismos internacionais em assuntos domésticos, como por exemplo a educação. Em resultado, os livros didáticos adotados na rede pública estão hoje carregados de propaganda anti-americana e rigorosamente expurgados de todo sinal de patriotismo e de cristianismo. 3) O próprio território americano vem sendo invadido e tomado por ONGs indigenistas e ecologistas européias. Já na metade da década de 80, dez por cento da área total do país estavam fora do controle dos cidadãos e do governo norte-americano, perfazendo o que já constituía, àquela altura, a maior transferência de propriedade imobiliária ao longo de toda a história humana. 4) As concessões da classe dominante à “New Left” desde os anos 60 transformaram o “establishment” acadêmico, jornalístico e cinematográfico numa máquina de propaganda anti-americana absolutamente incontrolável. As universidades americanas tornaram-se a maior rede de doutrinação marxista que já existiu no mundo, superando o próprio sistema universitário soviético. 5) A violenta repressão a todo anticomunismo tornou impossível ao governo deter a infiltração de espiões soviéticos, e depois chineses, no FBI, na CIA na Agência Nacional de Segurança e nos serviços militares de inteligência. Assim, por ironia, ao mesmo tempo que a abertura dos Arquivos de Moscou dava retroativamente razão a Joe McCarthy, comprovando que a penetração comunista na alta administração federal nos anos 50 tinha sido até maior do que ele dizia, e ao mesmo tempo que dirigentes soviéticos e chineses admitiam que na guerra do Vietnã as potências comunistas tinham gastado mais dinheiro em guerra psicológica dentro dos EUA do que em despesas bélicas na frente de batalha, a infiltração incomparavelmente mais vasta nos anos 70-90 se deu sob a proteção do preconceito “politicamente correto” que sujeitava à acusação de “fascista”, na grande imprensa, quem quer que ousasse tocar no assunto. Pretender que a nação que se desarma e se enfraquece a esse ponto possa estar ao mesmo tempo no auge de uma escalada imperialista global é abusar do direito à idiotice. Os EUA não são os donos do globalismo. São a primeira e a maior vítima dele. É verdade que algumas grandes fortunas norte-americanas aparecem entre as forças determinantes que criaram o novo estado de coisas. Mas confundir os planos de meia dúzia de dinastias monopolistas com o interesse nacional norte-americano ou com o espírito do capitalismo liberal é mais que idiotice: é loucura. Monopolismo e liberalismo são termos antagônicos, e muitas dessas organizações monopolistas já provaram seu anti-americanismo congênito ao financiar os dois regimes totalitários que mais se esforçaram para destruir os EUA: o comunismo soviético e o nazismo. No entanto a idiotice não surge do nada. Essas organizações são as mesmas que, junto com a solícita Comunidade Econômica Européia, subsidiam a maior parte dos movimentos de esquerda no mundo e despertam uma onda global de anti-americanismo cuja manifestação explícita tomou forma na Conferência de Durban. Foram elas que, a pretexto de anti-racismo, instalaram no poder os governos pró-comunistas da África do Sul e do Zimbabwe, hoje empenhados numa “limpeza étnica” que a Conferência, por seu silêncio ominoso, transformou de crime hediondo em direito e mérito. Basta uma pesquisa rápida nas fontes de financiamento da “intelligentzia” brasileira bolsas, “fellowships”, verbas para pesquisas e edições para verificar que, sem a ajuda dessas prestimosas organizações monopolistas, todo esquerdismo praticamente desapareceria do nosso cenário público. A fantasia idiota, pois, revela toda a sua razão de ser: se dentro dos EUA o monopolismo globalista se esforça para diluir a soberania nacional numa subserviência à “comunidade internacional”, nada mais lógico do que ele subsidiar, no exterior, a gritaria que lançará sobre a república norte-americana a culpa pelos malefícios da própria Nova Ordem Mundial que a oprime. O mais velho truque dos criminosos é inculpar as vítimas. Os intelectuais de esquerda, afinal, estão sempre necessitados de dinheiro e dispostos a deixar-se levar pela primeira cenoura-de-burro que alguém exiba diante de suas ávidas narinas. Ninguém se presta melhor a manipulações do que aquele tipo de intelectual ativista inculto, verboso, vaidoso e bocó que as universidades do Terceiro Mundo lançam anualmente ao mercado em quantidades apocalípticas. Não é de espantar que, sem uma clara visão intelectual do que se passa no mundo, essas pessoas sejam igualmente desprovidas de consciência moral e, crendo lutar pelo bem, assumam a defesa de qualquer crime hediondo que lhes pareça voltar-se contra a “bête noire” dos seus delírios: o imperialismo ianque. Assim, não faltam, nas telas de TV e nas páginas de jornais deste país, quem busque atenuar o horror dos atentados de terça-feira passada, legitimando-os como “conseqüências inevitáveis” da política externa de George W. Bush, como se operações terroristas tão complexas pudessem ter sido improvisadas nos poucos meses que se seguiram à posse do novo presidente. George W. Bush disse que, diante do horror do que se passou no World Trade Center e no Pentágono, os EUA estavam decididos a “não distinguir mais entre os terroristas e aqueles que os protegem”. Como não incluir, entre esses protetores, aqueles que, por inconsciência ou perfídia, realizam na mídia as operações de desinformação e guerra psicológica sem cujo apoio nenhuma agressão armada pode aspirar ao sucesso?

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