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Mostrando postagens de setembro, 2018

Galileu e Brecht Olavo de Carvalho

Galileu e Brecht Olavo de Carvalho O Globo, 23 de fevereiro de 2002 Galileu Galilei foi sem dúvida um homem de gênio. Bertolt Brecht, que o celebrou no teatro, foi no mínimo um talento extraordinário. Também é fato que ambos foram levados a interrogatório, o primeiro pela Inquisição, o segundo por uma CPI do Congresso americano. Mas sua verdadeira afinidade de personagem e autor não está nisso. Na época do iluminismo, o físico rebelde da Renascença foi consagrado como mártir da ciência, vítima da tirania obscurantista. Mas não foi nada disso. Galileu não sofreu processo por suas idéias, mas por ter insultado o Papa. O pontífice não podia suportar calado a ofensa nem queria castigar o insolente, que era seu afilhado de batismo. Montou então um arremedo de processo, uma “pizza”: seu protegido se submeteria por uns instantes à humilhação de desdizer-se em público e em seguida seria liberado para continuar lecionando o que bem entendesse, sem voltar a ser perturbado pelos inquisidores.

Fato concreto e depuração abstrativa Apostila do Seminário de Filosofia

Fato concreto e depuração abstrativa Apostila do Seminário de Filosofia Olavo de Carvalho 20 de fevereiro de 2002 Nenhum acontecimento, por mínimo que seja, pode se produzir sem que um número indefinido de acidentes faça convergir para o preciso momento e o preciso lugar em que ele se manifesta as inumeráveis linhas de causas e condições que sustentam sua manifestação. O acontecimento assim considerado denomina-se fato concreto. Concreto vem de cum+crescior, designando o crescimento concomitante e convergente desses vários fatores causais. Graças à superposição dos fatores acidentais, todo fato concreto pode ter, para seus atores e espectadores, uma multiplicidade de sentidos, que se organizam em várias articulações hierárquicas conforme o ponto de vista, defini do por sua vez por um determinado interesse cognitivo. Os vários interesses cognitivos, porém, podem ser por sua vez articulados hierarquicamente, segundo critérios de valor. O que tem valor para o personagem envolvido nã

Revolução gaúcha Olavo de Carvalho

Revolução gaúcha Olavo de Carvalho O Globo , 16 de fevereiro de 2002 A imaginação popular concebe as revoluções somente pelo lado espetaculoso, pela explosão insurrecional. Mas revolução é qualquer reviravolta profunda da estrutura de poder, seja operada por meio violento e ostensivo, seja introduzida aos poucos, de maneira quase imperceptível e aparentemente dentro da lei, sem que a população possa compreender ou controlar o curso dos acontecimentos. Duas das principais revoluções do século XX foram exatamente assim: a revolução alemã de Adolf Hitler e a tomada do poder pelos comunistas na Tchecoslováquia. Em ambos os casos, a violência só veio depois, quando era tarde para tentar detê-la. Mesmo nas revoluções cruentas, a brutalidade em toda a sua plenitude só se desencadeia após a tomada do poder. O que nunca houve nem haverá no mundo será uma revolução sem violência — nem insurrecional, no começo, nem repressiva, depois. Revolução “pacífica” quer dizer apenas uma revolução que só

No limite da candura Olavo de Carvalho

No limite da candura Olavo de Carvalho Zero Hora, 10 de fevereiro de 2002 Espero que, antes de solidarizar-se com as efusões de revoltafingida da esquerda chique contra a ascensão da delinqüência, o leitor se lembre de que essa gente apregoou aos quatro ventos as virtudes revolucionárias do banditismo, ensinou técnicas de guerrilha e organização paramilitar aos detentos da Ilha Grande e por fim encabeçou o movimento internacional de solidariedade aos seqüestradores de Abílio Diniz, em 1989, dando a seus sucessores na carreira do crime a esperança, senão a certeza, do respaldo midiático e da impunidade.A candura sonsa, a incapacidade de enxergar a malícia alheia, tem limites: ultrapassado um certo ponto, torna-se cumplicidade ativa do otário com o vigarista, do sequestrado com o seqüestrador, da vítima com os advogados de seus agressores e assaltantes. Se a opinião pública brasileira, malgrado os alertas que lhe chegam, ainda que parcos e escondidos nas entrelinhas de um noticiário

O único mal absoluto Olavo de Carvalho

O único mal absoluto Olavo de Carvalho O Globo, 9 de fevereiro de 2002 Norman Cohn, em “The Pursuit of the Millenium”, assinala uma característica proeminente de certas seitas gnósticas medievais: seus adeptos sentiam-se tão intimamente unidos a Deus que se imaginavam libertos da possibilidade de pecar. “Isto, por sua vez, os liberava de toda restrição. Cada impulso que sentiam era vivenciado como uma ordem divina. Então podiam mentir, roubar ou fornicar sem problemas de consciência.” A continuidade essencial da visão gnóstica do mundo nas ideologias messiânicas modernas — nazismo, fascismo, socialismo — é um dado histórico bem estabelecido pelos estudos de Cohn, Voegelin, Billington e tantos outros pioneiros que desbravaram o assunto desde a década de 30. É verdade que esses estudos continuam quase desconhecidos do nosso “establishment” universitário. Mas, quer o saiba ou não a elite intelectual de Catolé do Rocha, o fato é este: uma linha de sucessão perfeitamente nítida vem das h

Língua dupla e estratégia Olavo de Carvalho

Língua dupla e estratégia Olavo de Carvalho O Globo, 2 de fevereiro de 2002 Os “lugares-comuns” foram assim nomeados pelos retóricos greco-romanos, que os comparavam a depósitos públicos de lixo mental, onde o mais pobre dos argumentadores poderia sempre encontrar alguma ferramenta usada que o tirasse do aperto no confronto desvantajoso com o adversário mais sábio. Cada vez que alguém lança mão de um desses utensílios para dar impressão de pensamento quando não pensou coisa nenhuma, todo mundo sai perdendo: o idioma é lesado, a inteligência aviltada, a opinião pública ludibriada. No entanto, longe de mim desprezar a força dessas velhas armas. A potência inesgotável de lugares-comuns, clichês ou frases feitas assemelha-se à do moto-perpétuo: quanto mais gastos tanto mais persuasivos; quanto mais deslocados do assunto tanto mais eficazes. Sua maior virtude reside precisamente em desviar a discussão de um tema difícil e mal conhecido para o terreno firme das banalidades costumeiras, o

Outra história velha Olavo de Carvalho

Outra história velha Olavo de Carvalho Jornal da Tarde, 31 de janeiro de 2002 Outra história velha Não se espantem que, numa semana tão cheia de novidades, eu insista em contar histórias velhas. Nada pesa mais sobre as decisões do presente do que a visão do passado. Por isso os partidos totalitários se esforçam tanto em deformá-la segundo seus propósitos. Empenham nisto verbas consideráveis e os esforços de seus melhores intelectuais de aluguel: uma falsa imagem do ontem é o mais firme sustentáculo da mentira de hoje. Talvez o exemplo mais escabroso e mais típico de falsificação da História, nas últimas décadas, tenha sido o assalto geral à memória dos descobridores e colonizadores das Américas. Não há, hoje, quem não acredite piamente que foram ladrões e genocidas cruéis, tão famintos de ouro quanto sedentos de sangue indígena. Filmes, livros didáticos, reportagens em profusão – um bombardeio incansável e avassalador – fizeram da “leyenda negra” da colonização uma verdade estabele

O ovo da serpente por Alexandre Garcia

O ovo da serpente por Alexandre Garcia 29 de janeiro de 2002 Há oito anos, quando pedia voto para ser presidente da República, FHC mostrava na mão espalmada suas cinco prioridades. Um dos dedos era o da segurança pública. Que só fez piorar. Tucanos e petistas estão colhendo os frutos de sua política de combate ao crime. Em vez de matarem a serpente, fertilizaram-na e ela se multiplicou. Tucanos e petistas, acostumados a ver a polícia como uma ameaça, nos seus tempos de comícios de esquerda, parece que se vingaram. Acostumados a ver militantes perseguidos, trataram de dar direitos os perseguidos – só que hoje eles são militantes do Comando Vermelho, do Comando da Capital, do tráfico de drogas, dos seqüestros, do contrabando de armas, do controle das prisões. Os mais à esquerda viam a segurança pública como proteção das elites ameaçadas. Na luta de classe marxista, viam nas ruas apenas a revolução dos pobres contra os ricos. E assim foi durante mais de uma década. Nas ruas, os pobres

A farsa da farsa Olavo de Carvalho

A farsa da farsa Olavo de Carvalho O Globo , 26 de janeiro de 2002 No famoso “Imposturas intelectuais”, Alan Sokal pôs em teste a erudição científica dos mestres da esquerda contemporânea — Althusser, Foucault, Derrida, Lacan et caterva — e demonstrou que eram todos charlatães da mais baixa espécie. O historiador australiano Keith Windschuttle, em “The killing of History”, prova que em matéria de conhecimentos históricos eles não se saem nada melhor. Somem-se a isto os impiedosos exames lógicos empreendidos por Roger Scruton em “Thinkers of the new left” e a descrição apocalíptica que em “Tenured radicals” Roger Kimball apresentou da devastação mental das universidades americanas submetidas à influência desses gurus, e sobra no fundo de tudo apenas uma pergunta: como foi possível que durante meio século a intelectualidade esquerdista, a casta letrada mais pretensiosa que já existiu, a que mais candidamente se arrogou a missão de guiar o mundo, se deixasse por sua vez guiar pelos ma

Olavo de Carvalho - Lógica da Destruição

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Olavo de Carvalho - Conheça Fernando Haddad

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Olavo de Carvalho - Vídeo Mais Importante do Olavo

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Olavo de Carvalho - Não Tenho Medo da Morte

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Olavo de Carvalho - Brasil , País de Memórias Falsas

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Olavo de Carvalho - A Especialidade da Filosofia

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Escalada Olavo de Carvalho

Escalada Olavo de Carvalho Época, 26 de janeiro de 2002 Jornalistas de esquerda querem cada vez mais poder De tempos em tempos, ressurgem na imprensa denúncias alarmantes de que as Forças Armadas, por seus serviços de inteligência, estariam monitorando clandestinamente atividades lícitas, espionando ilegalmente cidadãos pacíficos e exercendo, em suma, o papel ditatorial de um “Big Brother”, em pleno Estado de direito. Quando se examina o caso de perto, o que se descobre é que, invariavelmente, os investigados têm ligações amistosas com organizações empenhadas em preparar a revolução continental que, nas palavras de Fidel Castro, “vai reconquistar na América Latina o que se perdeu no Leste Europeu”. Através da narcoguerrilha colombiana, essa revolução já ameaça nossas fronteiras, sob os aplausos de seus adeptos locais. O poder desses adeptos pode-se medir pela espessura do silêncio que tombou, desde a prisão de Fernandinho Beira-Mar, sobre os dados apreendidos no “laptop” do delinqü

O PT e a violência Maria Lucia Victor Barbosa

O PT e a violência Maria Lucia Victor Barbosa 25 de janeiro de 2002 Analisar em profundidade a violência num curto artigo seria impossível. Essa característica inerente ao ser humano demanda abordagens variadas que vão das filosóficas às sociológicas, das psicológicas às antropológicas. A violência pode ser estudada sob o ângulo da história, do direito, da economia e para combatê-la o Estado se utiliza da lei e de várias de suas instituições. No Brasil as causas da violência são bastante variadas e as opiniões sobre elas também. Há aqueles, por exemplo, que apontam apenas a pobreza como fator desencadeante de atitudes violentas que se desfecham na criminalidade. Porém é necessário dizer que, se o meio em que o pobre vive pode ser propício ao banditismo, tanto não procede o entendimento de que ele é um criminoso nato quanto a tendência de absolvê-lo a priori das penas previstas na lei quando comete um crime por considerá-lo vítima da própria sociedade. Justamente comiserações deste

PT colhe plantio por Janer Cristaldo

PT colhe plantio por Janer Cristaldo “Isso já passou dos limites”, disse o presidente Fernando Henrique Cardoso, comentando o assassinato do prefeito Celso Daniel. Elástica noção de limites, a do presidente. Ocorreram 307 seqüestros em São Paulo, só no ano passado. Quer dizer que quase um seqüestro por dia ainda não constitui limite? O brutal assassinato de uma senhora, liberada por seus captores e logo após fuzilada pelas costas em frente à própria casa, estaria ainda longe do limite? O narcotráfico, que administra as favelas e determina dias feriados ou de luto, fechamento de escolas ou comércio, não seria um limite? Ao que tudo indica, não. Pois, em sua magnanimidade, o príncipe dos sociólogos tem uma generosa noção de limite. Os seqüestros e assassinatos cometidos pelos terroristas que queriam transformar o Brasil em uma imensa Cuba, não só foram anistiados como seus autores foram regiamente recompensados com cargos e polpudas aposentadorias. Sem ir mais longe, podemos começar p

Uma história esquecida Olavo de Carvalho

Uma história esquecida Olavo de Carvalho Jornal da Tarde, 17 de janeiro de 2002 Eis aqui uma velha história que você pode usar como antídoto quando assistir, pela tevê, a alguns dos inumeráveis filmes que até hoje apresentam como heróis da liberdade os atores e as atrizes que entraram na famosa “Lista Negra” de Hollywood. Na noite de 5 de outubro de 1945, 1.500 piqueteiros, atendendo à convocação de uma central sindical comandada pelo Partido Comunista, cercaram os estúdios da Warner, em Burbank, Califórnia. O ator Kirk Douglas viu-os aproximar-se, armados de “facas, porretes, fios de aço, socos-ingleses, correntes”, e ocupar os quarteirões em torno. Ao chegar para o trabalho, os empregados foram impedidos de atravessar o portão, cujos guardas tinham sido surrados e dominados pelos grevistas. “Nem você nem nenhum outro f. da p. vai entrar aí hoje”, informou ao coreógrafo LeRoy Prinz o líder comunista Herb Sorrell, celebrizado com o apelido de “Generalíssimo”. Prinz, um veterano de g

Olavo de Carvalho

Olavo de Carvalho Zero Hora , 13 de janeiro de 2002 Um dos traços mais inquietantes que podemos observar na mentalidade de nossos contemporâneos é que, neles, a intensidade da revolta político-social está quase sempre na proporção inversa das injustiças e privações que sofreram. Rarissimamente encontramos, entre os pobres e oprimidos, aquela dose quase psicopática de ódio radical que com tanta facilidade aflora nos discursos de intelectuais, de funcionários públicos, de gente da classe média e alta. Uma primeira explicação — ou desculpa — com que se pode atenuar a estranheza do fenômeno é que a indignação dessas criaturas não brota de uma reação a danos pessoais que tenham sofrido, mas da contemplação, cruciante para suas almas sensíveis, de males infligidos a terceiros. Essa explicação surge quase por automatismo à simples formulação da pergunta, e ela parece até superlativamente satisfatória, na medida em que não somente explica, mas justifica. Não sendo a expressão de mágoas pe

Em parte alguma Olavo de Carvalho

Em parte alguma Olavo de Carvalho O Globo, 12 de janeiro de 2002 O espectrograma político convencional coloca, na esquerda, o comunismo soviético e chinês; na direita, o nazifascismo; no centro, o socialismo moderado, chamado “fabiano” na Europa e nos EUA por conta da Fabian Society, mas que equivale ao que em terra brasilis é conhecido como “tucano”. Todo o vocabulário consagrado, todas as discussões acadêmicas e parlamentares, todas as polêmicas de botequim dão por assentado que essa é a distribuição das idéias e partidos no mapa ideológico do universo. Se há no fundo de toda a tagarelice ideológica um consenso plenamente firmado, um ponto pacífico, uma zona neutral onde todos concordam, é esse. Basta um breve exame, porém, para demonstrar que esse esquema é falso, autocontraditório e inviável. O breve exame é o seguinte: do ponto de vista econômico, as duas pontas da escala são indiscerníveis do meio. O comunismo baseia-se no controle estatal da economia, o nazifascismo idem, o s

Luz do Oriente Olavo de Carvalho

Luz do Oriente Olavo de Carvalho O Globo, 5 de janeiro de 2001 O impulso essencial da modernidade, segundo o consenso dos estudiosos, é o imanentismo, a rejeição de um sentido transcendente da existência e a total circunscrição das esperanças humanas a este baixo mundo. Se a opção imanentista tem conseqüências lógicas bastante evidentes, a pertinaz ocultação delas, por outro lado, tem constituído uma das principais atividades culturais nos últimos dois séculos, dando origem a uma série interminável de desvarios e sofrimentos. Desde logo, um “sentido” não pode ser imanente de maneira alguma, já que ele é, por definição, aquilo a que uma coisa remete para além dela mesma: o sentido da vida, se existe, está para além da vida. Mutatis mutandis, o sentido da História só pode estar na meta-História. Não há como escapar disso. Abolir toda transcendência seria reduzir o significado à materialidade do signo: a completa redundância do completo nonsense. Poucos pensadores — um Emil Cioran, u

Um filósofo na mídia é um jesuíta entre antropófagos Entrevista de Olavo de Carvalho ao site Anedota Búlgara

Um filósofo na mídia é um jesuíta entre antropófagos Entrevista de Olavo de Carvalho ao site Anedota Búlgara 3 de janeiro de 2002 1) Qual deve ser o papel de um filósofo na mídia? E, neste sentido, o que representa a sua atuação na imprensa escrita? Um filósofo na mídia é um pregador “in partibus infidelium” — um jesuíta entre antropófagos. Não entendem uma palavra do que ele diz e ele ainda se arrisca a ser comido vivo. Em outras épocas, filósofos-jornalistas como Ortega y Gasset, Gabriel Marcel e Raymond Aron podiam contar com um público habilitado, que compreendia seus argumentos. Hoje é preciso, ao mesmo tempo, argumentar e ensinar ao público o que é um argumento. Pior ainda: quanto mais despreparado, mais o público de hoje é arrogante e palpiteiro. O que recebo de cartas pretensiosas, sem pé nem cabeça, é uma grandeza. 2) A revista Época transformou recentemente a sua coluna semanal em mensal, sem maiores explicações aos seus leitores. O que de fato aconteceu, e a que o